Um pouco a propósito do Michael Fassbender, vi finalmente o filme de que a Ana me falou há uns meses. A história inspira-se na curta-metragem Wasp, filmada em Dratford, pela qual a inglesa Andrea Arnold recebeu um Óscar. Depois foi até Glasgow filmar a sua primeira longa – Red Road - que a distinguiu no cenário britânico e arrecadou o prémio do júri em Cannes. Três anos mais tarde estava em Essex pronta para dissecar as entranhas da família suburbana, à maneira de anatomistas maiores como Mike Leigh e Ken Loach.
Fish Tank apresenta-nos Mia (Katie Jarvis), uma jovem adolescente de 15 anos com os serviços sociais à perna, por ter partido o nariz a uma rapariga, numa luta de bairro sem importância. Vive com a mãe alcoólatra e desempregada e com a irmã mais nova, num pequeno apartamento de um conjunto de prédios de reinserção social. O seu único interesse é dançar, mas os seus passos são ainda tensos e pouco confiantes.
Tudo nos é apresentado sob o seu ponto de vista. Estamos sempre ao lado dela, em casa, na rua ou no apartamento vazio onde ensaia - espaço de intervalo à contínua guerra que trava consigo e com o mundo. O que Mia tem de forte, também tem de vulnerável. Quer ser livre e estar sozinha, mas também quer sentir-se segura e amada. Incapaz de compreender e controlar a fúria, o desejo e o medo, constitui um quebra-cabeças para si própria. Todas as contradições características da adolescência são retratadas com extrema autenticidade.
Quando a mãe leva para casa o novo namorado, o ambiente familiar leva uma injecção de ordem e boas maneiras. Connor (Michael Fassbender) é divertido, atencioso, educado e até tem um emprego. Mia vê nele um pai ou um irmão mais velho, alguém que se preocupa – ao contrário da mãe, sempre bêbada ou de ressaca – e que a apoia no seu sonho de vir a dançar. Mas ela não sabe como expressar o afecto porque nunca o recebeu. Por isso, quando Connor se aproxima, Mia carrega o seu sistema de defesa pessoal, mas existe uma clara empatia entre eles. A rapariga está sobretudo fascinada. Nunca se tendo deparado com uma figura masculina tão prestável, embarca numa experiência de descoberta perigosa e excitante.
Bem vistas as coisas, Connor é bom demais para ser verdade. Não faz sequer sentido namorar com a mãe de Mia porque são dois seres antagónicos. O seu papel no seio daquela família começa a ser difícil de definir e perguntamo-nos até que ponto será assim tão bonzinho. Quando Mia descobre a verdade, a sua adoração transforma-se em ódio e, determinada a passar por cima do sucedido, decide à pressão fazer um jogo demasiado arriscado, para o qual não está preparada. A sequência de perseguição no terreno baldio é decisiva para ela, pois é aí que percebe até onde as circunstâncias a podem levar. Segura de não querer ser essa pessoa, vai-se embora daquele lugar, de onde nada de bom sairá.
No final, a dança com a mãe transparece optimismo. Arnold não quer passar uma imagem miserabilista, inclusive filmou no Verão para que o sol brilhasse em quase todas as cenas. Evita também quaisquer juízos de valor e explicações desnecessárias, especialmente na relação de Connor e Mia.
A performance de Katie Jarvis (distinguida com vários prémios) é extraordinariamente convincente, principalmente para uma actriz não profissional – foi o seu único papel até à data - e Fassbender tem mais um desempenho sem quaisquer pontas soltas. O filme recebeu também o prémio do júri em Cannes.
O mais recente filme de Arnold, Wuthering Heights, é baseado no romance de Emily Bronte, de 1847, e foi apresentado em Veneza, no ano passado. Conta com Kaya Scodelario da série Skins.
Gostei muito deste FISH TANK, contudo sou um grande apreciador de RED STATE, um dos filmes (na minha opinião) mais perturbadores e incisivos da última década. Já o viste? :)
ResponderEliminarCumps cinéfilos.
Não, mas não me parece que tenham algo que os relacione. A que propósito veio essa associação?
ResponderEliminarReparei agora que, no meu comentário anterior, cometi um lapso: queria mencionar o RED ROAD, também da Andrea Arnold, e não RED STATE.
ResponderEliminarDesculpa o engano :/
Ah! Bem estranhei. Ainda não vi esse, é o próximo ;)
ResponderEliminarTanto um como o outro são muito bons, com o realismo de Mike Leigh mas muito mais admiráveis tecnicamente e com histórias que me tocam muito mais. O Fassbender é o maior!
ResponderEliminarPara mim, o Mike Leigh está muito lá em cima, num estádio de maturidade e perfeição a que é extremamente difícil chegar. O Fassbender está a caminhar a bom passo para esse Olimpo.
ResponderEliminarExcelente review ao filme. Totalmente de acordo. Não tinha reflectido nisso mas realmente é verdade que as cenas diurnas são muito solarengas. E desconhecia que a Katie Jarvis, não era actriz, ela que fez um papelão e conseguiu transformar-se, revelando facetas da sua personagem em grandes performances e com isto dizer que ela por vezes parecia mesmo uma menininha adolescente e na cena da festa em casa parecia já uma adulta. Muito bom filme e abre a vontade de ver o seguinte filme da realizadora Andrea Arnold!
ResponderEliminarCuriosamente não gostei do Fish Tank, mas percebo o propósito do filme...no entanto, gostei mais do Red Road.
ResponderEliminarcumprimentos,
cinemaschallenge.blogspot.com