Ao escrever um artigo sobre Almodóvar (que pode ler-se aqui), veio-me imediatamente à lembrança este filme, melodrama dos melodramas.
Quinta longa de Kazan, Splendor é dramático, exacerbado e controverso, visto dentro do seu tempo. A acção decorre entre o fim dos anos 20/inícios dos anos 30, no começo da depressão, em Kansas. Encara o primeiro amor e as consequências desastrosas da repressão sexual num par de adolescentes apaixonados, quando novos sentimentos aparecem e são contrariados devido aos valores morais e éticos que a sociedade prega.
Existe aqui esse modo romântico de olhar o amor, de o divinizar, elevando a sua não concretização ao patamar da maior dor, uma dor consentida e quase fonte de prazer – aquele prazer que é o do sofrimento. O colapso do romance coincide com o crash da Bolsa de Valores de Nova Iorque, em 1929.
Apesar de ser já um filme de 60, veio no seguimento dos filmes dos anos 50 que retratam os problemas e a exploração da juventude, como Picnic (1955), Rebel Without a Cause (1955), East of Eden (1955), Peyton Place (1957), A Summer Place (1959) e o musical do mesmo ano West Side Story (1961).
A decoração do quarto de Deanie é símbolo da sua inocência, com tons rosa, fotografias de Bud e um ursinho castanho.
Bud quer fugir de um troféu que não conquistou, herdou – a torre de petróleo. Depois da irmã ter fracassado, tem se suportar sozinho as esperanças do pai.
Ginny lembra a Marylee (Dorothy Malone) de Written on the Wind (Douglas Sirk, 1956).
Mrs. Stamper é uma personagem sem carácter ou opiniões, que vive à sombra do marido. Ace domina-a, a ela e ao filho, que por seu turno saiu apagado como a mãe, sem grandes talentos ou vontade de marcar a diferença. É interessante ver que é Ginny a mais parecida com o pai, determinada e desobediente, é dona do seu nariz.
Na cena em que Bud vê Ginny num carro com um homem qualquer, entra numa luta, mas não é só pela irmã que luta. Também ele se sente a cair e então começa ao murro a todos os homens que lá estão, libertando a sua fúria e a sua frustração. A adolescência devia ser um período de experiência e descoberta, um mundo que Ginny já esgotou e onde Bud ainda nem entrou, completamente castrado por Deanie, pelo pai e pela sociedade. Enquanto luta com os homens que abusam da sua irmã, ela observa a cena a chorar, vendo a sua degradação e aquela em que colocou o irmão – é por Ginny ter arrasado com tudo o que o pais lhe proporcionaram, que Bud é tão pressionado - e ela está sinceramente triste nesta cena, a última em que a vemos. Para ela não há salvação, Ginny vai ter de morrer, pois apenas os bem comportados merecem o perdão.
Os Stamper acabam por se extinguir naquela cidade e a sua casa tornou-se numa funerária, simbolizando a morte do pai, da filha e da sua fortuna.
A felicidade que Deanie queria está representada na família que Bud construiu. Agora já nem é uma questão de diferença de classes, porque Bud é muito mais pobre que ela e Angelina muito mais campónia. É uma questão de tempo. Bud nada fará para recuperar o tempo que o afastou de Deanie. Ele é o conformista desta história, e ela a vencida. Foi o desejo que a levou à loucura. O desejo que estava fora do quadro de uma sociedade puritana e rígida. O seu pecado começou dentro da sua própria cabeça, não precisou sequer de uma concretização.
O filme atravessa a crise económica, a crise moral e de costumes. É nostálgico, dorido e apela aos sentimentos e às relações afectivas. As personagens são estereotipadas. Temos a família pobre e a família rica, uma rapariga inocente e virginal (Deanie) e a sua antítese (Ginny), e um amor não consumado.
Bud acabou por não corresponder a nenhum dos sonhos que o pai tinha para ele e ficou com uma rapariga ainda mais pobre que Deanie, que por seu turno percebe que o seu herói dos tempos do Liceu, não passa agora de um homem que ganha o suficiente para dar de comer à mulher e aos filhos. Deanie está agora muito mais madura que ele. Ambos tiveram de aceitar compromissos nas suas vidas e ela compreende que a paixão que um dia partilharam nunca mais será recuperada, pois muita coisa já se passou desde que eram dois miúdos. Despedem-se, sabendo que o seu capítulo conjunto está encerrado, que não vão ter vidas entusiastas, mas que vão seguir em frente, ainda que resignados ao contexto.
Quando Hazel pergunta: “Deanie, honey, do you think you still love him?”, ela olha para o seu futuro, aceitando-o. Resolvidos os seus conflitos interiores, os seus anseios e desilusões, põe de lado a exuberância da juventude e ganha força a partir do que resta – as suas memórias:
“Though nothing can bring back the hour
Of splendor in the grass, of glory in the flower
We will grieve not, but rather find
Strength in what remains behind.”
We will grieve not, but rather find
Strength in what remains behind.”
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